Roupa apertada
Aumentam em todo o País os índices de inadimplência, situação em que o
devedor deixa de honrar seus compromissos financeiros, quase sempre
porque não pode. Crescem, também, os índices de endividamento das
famílias.
Desta vez, não são somente os números do Banco Central que comprovam
esse aperto financeiro do consumidor do Brasil. Também apontam na mesma
direção levantamentos da Federação do Comércio de São Paulo (veja mais,
na página B1).
São três os principais fatores responsáveis por essa situação. A
primeiro deles é a inflação. A alta do custo de vida começa a fazer
estragos crescentes no orçamento familiar. É a sobra de mês no fim do
salário, que obriga o consumidor a escolher o pedaço de seus custos que
fica sem cobertura. Nessas condições, a expansão da dívida não resolve,
porque acrescenta carga de juros à relação de despesas mensais.
O segundo fator a elevar a propensão ao calote é a nova pressão dos
serviços sobre o custo de vida. Quem compra um carro, por exemplo, não
tem de arcar apenas com mais uma prestação mensal. De repente, vê-se
tomado por novas despesas, algumas delas imprevistas: combustível,
seguro, impostos, mecânica ou assistência técnica, estacionamento,
flanelinha, valet. Fica inevitável levar a família para um fim de semana
na praia ou para o shopping center e aí as contas se multiplicam.
O terceiro ponto é certo descontrole dos bancos, que passaram muitos
anos ganhando com a aplicação em títulos públicos e se desacostumaram
com o crédito e com a administração de risco. Quando se viram obrigados a
girar sua carteira de crédito, sob pena de perda de rentabilidade e de
participação de mercado, tiveram de enfrentar a inadimplência.
O aumento do endividamento familiar é consequência do forte aumento
das operações de crédito. No ano 2000, o estoque de crédito prestado
pelos bancos no Brasil não passava de 27% do PIB. Agora, já é superior a
50%. Além disso, cresceu substancialmente a utilização dos cartões de
crédito, não somente como meio de pagamento, mas também como sistema de
crédito complementar.
Por enquanto, o aumento da inadimplência parece administrável. Mas já
leva a duas consequências: (1) vem obrigando os bancos a reservar
parcelas crescentes de recursos para provisão de créditos de retorno
duvidoso; e (2) impõe mais cautela às instituições financeiras nas
concessões de créditos novos.
Do ponto de vista da administração econômica, o aumento da
inadimplência deveria ser razão suficiente para colocar em movimento
políticas de maior controle da inflação.
A corrosão do poder aquisitivo do consumidor por si só cria
distorções, como pressões por reajustes salariais e por reindexação da
economia, que realimentam a inflação, como já está acontecendo. Além
disso, sabota o crescimento econômico, na medida em que reduz o consumo
e, portanto, estreita o mercado interno.
Por enquanto, apenas o Banco Central parece determinado a combater a
inflação por meio da redução do volume de dinheiro na economia (política
monetária). E, no entanto, sem mais austeridade na administração das
contas públicas, o alcance da política de juros tende a ser limitado.
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