quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Veneuela no Mercosul 2

Texto do Blog do Reinaldo Azevedo:

"CEDEÑO, UM PRESO POLÍTICO DE CHÁVEZ. OU: “ALÔ, SENADO BRASILEIRO! É PRECISO TER VERGONHA NA CARA!

Está em curso na América Latina um novo entendimento de democracia que democracia não é. Trata-se do que já chamei aqui de “Populismo Absolutista” ou “Absolutismo das Urnas”. Segundo seus próceres, desde que a população seja consultada, em processos eleitorais eivados de vícios, tudo é possível. Os mandatários receberiam o endosso das urnas não para cumprir as regras constitucionais que os elegeram, mas para fraudá-los à vontade. É assim que Chávez está consolidando uma ditadura na Venezuela. Rafael Correa (Equador) e Evo Morales (Bolívia) seguem o mesmo caminho. Na Nicarágua, o golpe institucional de Daniel Ortega está em curso. Em Honduras, por ora, a turma deu com os burros n’água — ou com o jumento na embaixada…

No dia 29, a Comissão de Relações Exteriores do Senado brasileiro vota um parecer favorável ou contrário à entrada da Venezuela no Mercosul. Esse parecer será submetido depois ao plenário. Uma retórica que apela à mais descarada vigarice política está em curso. O protocolo do Mercosul inclui a exigência democrática, vale dizer, as não-democracias estão fora. O senador Aloizio Mercadante (PT-SP), por exemplo, admite que o modelo venezuelano não é lá muito democrático, mas diz que seria pior isolar o governo Chávez. Corolário: a cláusula democrática abriga democratas por obrigação e ditadores pode generosidade. Mercadante é um monumento!

Por que isso tudo? Esteve no Brasil, na semana passada, o advogado canadense Robert Amsterdam. Ele é defensor do empresário venezuelano Eligio Cedeño, preso desde fevereiro de 2007. A acusação oficial contra Cedeño é de fraude financeira. O que não aparece nos autos é o fato de que ele deu apoio a oposicionistas venezuelanos, incluindo um sindicalista e uma jornalista que tiveram de fugir do país. O caso da fraude é um tanto rocambolesco e sugere que ele caiu numa armadilha. Ainda que tudo fosse verdade, fato é que o tempo de sua prisão preventiva — dois anos (!) — expirou, e ele é mantido ilegalmente no cárcere. E há a ameaça de que ela seja prorrogada por outros dois.

Hugo Chávez destruiu o sistema judicial da Venezuela. A pedra-de-toque de sua intervenção foi a criação, pela Assembléia Constituinte, manipulada por ele, de uma comissão do Supremo Tribunal de Justiça (é o correspondente ao nosso STF) que, ATENÇÃO!, contrata e demite todos os juízes do país. Em 2004, o número de membros da Corte saltou de 20 para 32. Os 12 indicados eram todos… bolivarianos! Nota à margem (retomarei o assunto muitas vezes): Lula quer criar uma comissão especial para avaliar obras que o Tribunal de Contas da União considera irregulares. É a aplicação do método bolivariano para mudar as instituições.

Amsterdam tenta chamar a atenção do Brasil — e do mundo — para o que está em curso na Venezuela. A Justiça comum está sendo manipulada de forma escancarada, vergonhosa, para punir aqueles que Chávez considera seus inimigos. O advogado concedeu a seguinte entrevista ao blog:

Blog - Por que Eligio Cedeño está preso?
Amsterdam -
Eligio Cedeño está preso porque Hugo Chávez acredita que ele constitui uma ameaça política ao seu governo. Cedeño está na prisão desde fevereiro de 2007 sob as alegações de fraude cambial. Ele nunca foi condenado por nenhum crime e, em seu primeiro julgamento, o juiz foi afastado pelo Ministro da Justiça na noite anterior ao veredicto. Acreditava-se que seria favorável a ele. Nenhum explicação foi dada. Nós acreditamos que esse ataque ilegal e a indiferença aos seus direitos legais são motivados por razões políticas, incluindo o patrimônio financeiro de Cedeño.

Blog - Chávez está recorrendo à Justiça criminal para punir seus adversários políticos. É isso?
Amsterdam -
Sim. O processo contra Cedeño é só mais um exemplo, entre tantos outros, do uso que Hugo Chávez faz do sistema judiciário da Venezuela para punir adversários e oponentes políticos. A agressão aos juízes e promotores de Justiça e a coação de testemunhas são exemplos do uso da Justiça como arma política. Um exemplo é o caso da juíza Yuri Lopéz, que, ao admitir uma queixa secundária da parte de Cedeño, teve seu filho de 11 anos ameaçado de seqüestro. As violações de Chávez não estão ocultas. São, ao contrário, bastante visíveis com o objetivo de desencorajar os potenciais atos de seus opositores.

Blog - Uma das características do bolivarianismo é recorrer a mecanismos da democracia para destruir a própria democracia. Como isso se deu no sistema judicial venezuelano?
Amsterdam -
Desde os eventos de 2002 [tentativa de deposição de Chávez], a administração de Chávez fez inúmeras mudanças em seu sistema legal, o que reduziu a independência do mesmo. Por exemplo, Chavéz aumentou o número de ministros da Suprema Corte e preencheu estes novos cargos com pessoas leais a ele. Ao mesmo tempo, as regras de nomeação e demissão de juízes e promotores de Justiça foram flexibilizadas para viabilizar a nova estratégia. A Justiça tornou-se totalmente política.

Blog - Qual é, hoje, a situação dos direitos humanos na Venezuela?
Amsterdam -
É de completa deterioração, e isso se deu em um tempo curto. Houve um grande massacre dos direito humanos, incluindo ataques sem precedentes à oposição, especialmente depois da última eleição, em fevereiro de 2009. Chávez adotou uma lei draconiana para a educação, fechou mais de 100 emissoras de rádio e eliminou os poderes de certos líderes eleitos pela oposição. Talvez o exemplo mais importante do grave retrato dos direitos humanos na Venezuela seja o da procuradora-geral da república, Luiza Ortega Dias, que tomou medidas para criminalizar protestos públicos sob o pretexto de “incitarem a desordem social”. Na medida em que a situação continua se deteriorando, torna-se cada vez mais difícil para governos estrangeiros uma ação para impedir a derrocada da democracia venezuelana.

Blog - O sr. considera que o mundo sabe como funciona exatamente o sistema judicial da Venezuela?
Amsterdam -
Absolutamente, não. E isso não é por acaso. A Venezuela gasta uma enorme quabtidade de dinheiro para limpar sua imagem e reputação — que dependem do apoio de alguns de extremistas e de várias pessoas sem acesso a informações fidedignas.

Blog - O que acontece com um juiz que toma uma decisão que não seja do agrado de Chávez?
Amsterdam -
Dado o caso da juíza Yuri Lopez, que citei, é possível constatar que as medidas podem ser extremas. Outro caso que exemplifica as conseqüências de um juiz que toma decisões que não vão ao encontro do desejo de Chávez é o da juíza Alicia Torres. Ela foi demitida depois de se recusar a acatar o pedido de prisão do presidente da rede de televisão Globovision. Há muitos outros casos como esses. Em face disso, a maioria dos juízes desiste de atuar em certos casos para garantir sua proteção pessoal.

Blog - O sr. tem idéia do número de pessoas hoje acusadas pela Justiça criminal, mas que, na verdade, são perseguidas políticas?
Amsterdam
- O número oficial de prisioneiros políticos na Venezuela é 50, mas posso afirmar que são centenas. No início deste ano, estive em um congresso de estudantes venezuelanos que tinham entre 16 e 21 anos. Eles relataram diversas histórias de colegas que foram presos e que, mesmo depois de libertados, sofreram sanções, como a obrigatoriedade de se apresentar aos tribunais duas ou três vezes por semana - em alguns casos ainda mais.

Blog - Na sua opinião, o sistema judicial venezuelano evidencia que o país é uma ditadura?
Amsterdam
- O regime venezuelano atual é uma forma de junta militar de esquerda. O fato de os militares estarem no controle do País foi mascarado pelo mito da democracia. Se tiver alguma dúvida, sugiro que observe as pessoas que controlam os principais setores da sociedade venezuelana."

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